Sunday, January 21, 2007

Talvez

Na grande questão do aborto, decidi fazer campanha pelo talvez. Depois de muito pensar e me informar, e voltar a pensar depois, cheguei à conclusão que não me revejo nem no sim nem no não. Não sei ainda como vou montar a minha estratégia de campanha, até porque não parece ter sido prevista uma posição que excluísse as duas que estão a ser impostas, mas como a razão está do meu lado, só tenho que seguir em frente com fé. É precisamente por aí, pela confrangedora pobreza da proposta, que a minha campanha do talvez vai começar: o referendo ao aborto, nos moldes em que está definido, corresponde a um efectivo aumento dos impostos. Estamos, portanto, perante mais uma clamorosa violação das promessas eleitorais. Como sabem a violação é uma das circunstâncias em que o aborto já é permitido na actual legislação. Havendo neste caso, uma violação, parece-me a mim que há fortes probabilidades de o referendo ao aborto ter o direito de ser abortado. Porém, e aqui se vê a diferença da minha proposta, o talvez é uma posição que deixa em aberto a hipótese de não se fazer o aborto mesmo no caso de violação.
Eu sei que o talvez vai ser visto por muito boa gente - e pela má ainda mais - como uma espécie de pelo sim pelo não. Nada de mais errado porque o talvez é mesmo para ser ao mesmo tempo contra o sim e contra o não, mantendo-se na equidistância central que é própria da virtude.
O talvez pretende dar uma hipótese ao abortado de ter uma palavra a dizer. É um pouco como a escolha da religião ou do clube de futebol: será a consciência do próprio indivíduo a determinar a ocasião do seu próprio aborto, mais o recurso eventual a opiniões externas (do tipo deixar os pais dos alunos dar notas aos professores).
Tudo isto parecerá um pouco confuso se não se tiver em conta que o meu projecto vai definir duas novas figuras legais, que passariam a ter efeito se o talvez ganhasse. Refiro-me ao aborto retroactivo e ao aborto a título póstumo.
O aborto retroactivo destina-se a ser aplicado a todos aqueles que a dada altura da sua vida se reconheça ter sido um grave erro não terem sido abortados até às dez semanas. O exemplo recente de Saddam Hussein.
O aborto a título póstumo tem como objectivo ser atribuído a todos aqueles que só depois de terem morrido se lhes reconhece a perniciosidade com que nasceram, e que leva a sociedade a concluir que melhor teria sido se tivessem sido eliminados na altura certa. Augusto Pinochet, por exemplo.
A mais inovadora das propostas é também a que irá ter mais resistência, uma vez que é minha intenção que caso vença o talvez, possa entrar imediatamente em vigor, dando hipótese a que nos livremos de algumas personalidades da nossa vida política e social, que deveriam ter sido abortadas há muitos anos e não foram por causa do não.

Alícia Neto

3 comments:

Elipse said...
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ivamarle said...

a proposta vai ser, no mínimo, como direi?...polémica!!!!!!!!!!!!

Mónica said...

isto tem qq coisa de jakim